Era no mínimo curiosa a sua singularidade logo percebida por qualquer um que adentrasse o recinto. Por mais que se vestisse aleatoriamente como os demais presentes, transbordava a eloqüência do seu silêncio. Era invisível e tão presente...
Pouco falou durante a noite.
Dedicou-se a observar. E a ser observado, é claro. Tentava não ser notado, entretanto, quanto mais se escondia, mais concreta transformava-se sua presença.
Como naquele filme de Buñuel, sem razão alguma ficamos onde havíamos nos reunido. As luzes foram apagadas e todos supostamente ali tomaram um breve descanso.
Era claro que jamais conseguiria adentrar o reino de Morfeu naquela posição, no entanto, o fez. O estado vegetativo era abruptamente interrompido por espasmos quase esquizofrêmicos.
Enquanto todos ainda oscilavam entre estágios diferentes do sono, levantou-se e seguiu caminho enfrentando o labirinto formado por corpos e móveis.
Sentou-se.
Pôs suas armas sobre a mesa e começou a destilar seu veneno.
As idéias lhe haviam incomodado durante a noite. Tinha a necessidade de escrever e se livrar de tudo que lhe roubava o pensamento.
Preencheu intermináveis páginas e comprovou sua teoria lançada na noite passada que até então eu duvidava.
"Escritores nada têm de generosos. São seres extremamente egoístas que fazem uso da palavra para exorcizar a alma. Generosos, sois vós, leitores que insistem em dar sentido ao escárnio de mim mesmo."
Romina Cácia